O licenciamento de automóveis no Rio de Janeiro não depende de vistoria do Detran. Pelo menos não para o advogado João Pedro Campos de Andrade Figueira, que conseguiu uma liminar, na quarta-feira (28/4), para poder licenciar seu carro. Para a Justiça do estado, só a União pode legislar sobre trânsito, o que torna ilegais as normas estaduais que condicionaram o licenciamento à vistoria.
A decisão foi tomada pela juíza Neusa Alvarenga Leite, da 14ª Vara da Fazenda Pública da capital. “Os atos administrativos não podem ampliar matérias que não estejam disciplinadas em Lei, sob pena de burlar o comando constitucional”, disse ela na liminar. “Não se pode permitir que toda documentação referente a um automóvel somente seja deferida após a vistoria.” O Mandado de Segurança foi ajuizado pelo advogado Leandro Mello Frota.
Em 1998, o Conselho Nacional de Trânsito editou a Resolução 84/1998, que disciplinava a necessidade de vistoria para o licenciamento anual obrigatório. Um ano depois, no entanto, a exigência caiu, depois que o órgão publicou a Resolução 107/1999. Desde então, não há norma federal que obrigue os proprietários a submeter os veículos ao Detran antes de licenciá-los. “Compete exclusivamente à União legislar sobre trânsito, o que fez com a edição do Código de Trânsito”, disse a juíza.
Segundo ela, a obrigação de se fazer vistoria é uma forma de o estado exigir a quitação de multas e tributos, “manobra que objetiva criar receita sem a propositura da ação executiva própria”. A obrigação, no caso, não teria propósito de fiscalização dos automóveis, e sim de arrecadar.
“Se um carro é vendido duas vezes em um ano, fará duas vistorias para transferência de propriedade, o que demonstra que o objetivo da exigência não é a inspeção de segurança”, lembrou a juíza. Ela determinou que o Detran fluminense licenciasse o automóvel em 2010 sem que a vistoria fosse feita.
Leia a liminar:
Trata-se de demanda em que o impetrante objetiva o licenciamento do veículo sem a realização da vistoria. Conforme se constata da Constituição da República em seu artigo 20, XI, compete exclusivamente à União legislar sobre trânsito, o que fez com a edição do Código de Trânsito. Desta forma, para melhor desempenho e organização estabeleceu-se que o CONTRAN regulamentaria algumas situações, dentro elas o sistema de licenciamento.
Ocorre que a Resolução nº 84/1998 do CONTRAN que estabelecia a vistoria como exigência obrigatória para o licenciamento do automóvel, foi suspensa pela Resolução nº 107/99 impedindo a sua aplicação desde esta data. Frise-se que o Código de Trânsito não exige a vistoria, o que impede a edição de Resoluções e Portarias como forma de restringir direito.
Os atos administrativos não podem ampliar matérias que não estejam disciplinadas em Lei, sob pena de burlar o comando constitucional. No Estado do Rio de Janeiro, em regra, são as Portarias e Resoluções que disciplinam todas as controvérsias referentes à regularização dos veículos, procedimento inadequado e que atinge o usuário do serviço. Ressalte-se que a exigência da autarquia possui interesse duplo, pois ao exigir a vistoria, por via transversa, impõe o adimplemeneto de todas as multas e tributos relacionados ao bem, manobra que objetiva criar receita sem a propositura da ação executiva própria. Conforme se verifica no sistema atual, todos os procedimentos referentes à regularização de automóvel geram a vistoria com o pagamento do respectivo DUDA.
Se um carro é vendido duas vezes em um ano, fará duas vistorias para transferência de propriedade, o que demonstra que o objetivo da exigência não é a inspeção de segurança. Por outro lado, desde que legitimamente autorizado, o DETRAN pode realizar a inspeção de segurança dos carros, no entanto, não se pode permitir que toda documentação referente a um automóvel somente seja deferida após a vistoria. Os atos administrativos devem observar o princípio da razoabilidade, sob pena de ultrapassar os limites da isonomia também exigida pela Constituição.
Em face do exposto, DEFIRO A LIMINAR para determinar o licenciamento anual de 2010 do veículo conforme documento de fls. 15/16, sem a exigência de vistoria. Certificado o correto recolhimento das custas, intimem-se. Notifique-se a autoridade coatora. Intime-se para apresentar impugnação. Decorrido o prazo legal, com ou sem manifestação, ao Ministério Público. P.I.
Processo 0130323-42.2010.8.19.0001
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